1. Introdução
O texto completo de São Mateus dessa semana são os capítulos 19-22, quando nos é apresentado O Advento do Reino dos Céus.
São Mateus tem uma técnica própria de escrever. Ele faz uma parte narrativa e um discurso. Nesse caso, o texto completo englobaria São Mateus 19-25, sendo que a parte narrativa está em São Mateus 19-23 e o Discurso está em São Mateus 24-25. Mas leremos apenas Mateus 19-22 e o restante na próxima semana.
2. Objetivo de São Mateus
Dada a semelhança da pedagogia de Mateus, permito-me repetir aqui o mesmo que disse relativamente à leitura anterior. Isso para reforçar a compreensão do método de trabalho de São Mateus.
Vejamos então.
É interessante aqui lembrar que São Mateus antes de conhecer Jesus era um cobrador de impostos. O Império Romano tinha a sua sede em Roma, as províncias distantes, como a Judeia, situada a milhares de quilômetros de Roma, eram administradas por um Governador (Praefectus) romano, alguns auxiliares e a segurança ficava a cargo das Legiões Romanas, comandadas por um Tribuno, que era um oficial de alta patente do Exército Romano.
Algumas atividades, como a cobrança de impostos, que era muito importante para o Império, ficava a cargo de pessoas do próprio povo dominado, que era contratado pelo Império Romano. O Império terceirizava a cobrança de impostos, mediante alta remuneração a pessoas locais do povo dominado. São Mateus, antes de conhecer Jesus, foi um destes cobradores de impostos, prestando serviços ao Império Romano.
Essa atividade exigia de São Mateus um raciocínio lógico, boa lida com números e valores e uma capacidade de organização de ideias acima da média. Podemos dizer, em uma linguagem de hoje, que São Mateus era uma pessoa com excelentes conhecimentos de administração, gestão e contabilidade, essenciais para o desempenho de sua profissão.
Essas características serão visíveis em seu Evangelho. Veja como ele organiza e apresenta as ideias do seu Evangelho até aqui:
- Origem humana de Jesus (1,1-17);
- Origem divina de Jesus (1,18-25);
- Infância de Jesus (2);
- Apresentação do Reino dos Céus (3-7);
- Preparação para o Reino dos Céus (8-10);
- O Mistério do Reino dos Céus (11-13);
- A Igreja como primícias do Reino dos Céus (14-18).
Observe que São Mateus tem um objetivo claro, mostrar que o próprio Deus entrou na história da humanidade se fazendo homem (1,1-17), mas de forma milagrosa (1,18-25) e cresceu a partir da infância para se fazer homem e anunciar o Reino dos Céus (2).
Agora ele quer mostrar a todos o Reino dos Céus. Inicialmente Jesus apresenta o Reino dos Céus (3-7), prepara o povo para pensar no Reino dos Céus (8-10), mostra que o Reino dos Céus é uma realidade sobrenatural, divina e futura, realizando-se após a morte (11-13), mas esse Reino dos Céus pode e deve ser vivenciado, realizado e experimentado antecipadamente aqui na terra, na forma da Igreja. Para tanto São Mateus apresenta nos capítulos 14-18 a Igreja como as primícias do Reino dos Céus.
Agora depois de todo esse esforço, São Mateus percebe que a sua pedagogia na apresentação do Reino dos Céus está pronta. Chegou a hora de anunciar a chegada desse Reino… é o Advento Próximo do Reino dos Céus.
3. Parte Narrativa – Capítulos 19-22
A primeira parte do texto (19-23) é um conjunto de narrativas, sinais, milagres e eventos, mostrando que é possível e viável viver essa vida como uma antecipação do Reino dos Céus.
3.1. Perguntas sobre o Divórcio e a Continência Voluntária (19,1-12)
O questionamento acerca de uma suposta vida conjugal no Reino dos Céus é o momento de Jesus explicar e fazer crer que o modelo de vida nos céus será diferente. Enquanto no mundo preza-se por relações a partir de interesses afetivos, sociais, parentais e outros, nos céus os salvos serão seres eminentemente espirituais. O padrão de relações interpessoais entre os salvos, os anjos e o próprio Deus superarão enormemente o modelo de vida que possuímos hoje.
Mas existe aqui outra lição que nos é trazida pela Igreja quanto à seriedade e indissolubilidade da vida conjugal, pois ela expressa simbolicamente a união entre Cristo e a Igreja.
3.2. Jesus e as Crianças (19,13-15)
A pureza, a simplicidade, a inocência e a integridade de alma e de coração é o padrão que o católico deve perseguir para almejar o Reino dos Céus. Não se trata de infantilidade e uma simplicidade inocente, mas de uma postura de se colocar diante do outro sem preconceitos, sem juízos desnecessários e sem ódio, mas com uma disposição de amar e de acolher.
3.3. O Jovem Rico e o Perigo das Riquezas (19,16-26)
As riquezas do Reino dos Céus, as alegrias de viver diante de Deus e a eternidade em si são enormemente superiores a tudo aquilo que julgamos valoroso neste mundo. A parábola do jovem rico nos ensina que o seguimento de Cristo deve ser a prioridade absoluta de nossa vida. Não, a Igreja não lhe pedirá a doação de todos os seus bens, mas pedirá que você não confie a sua vida e eternidade nos bens que você tem.
3.4. Recompensa em Razão do Desprendimento (19,27-30)
O seguimento integral de Cristo será recompensado e a recompensa pode se iniciar nessa existência, mas será integral e incomparável na eternidade.
3.5. Parábola dos Trabalhadores enviados à Vinha (20,1-16)
Na Igreja de Cristo que é a vinha da parábola existem diversos trabalhadores. Alguns estão na vinha há muito tempo, enquanto outros chegaram na vinha há pouco tempo, mas todos devem trabalhar na vinha. Sentimentos diversos de ciúmes, questionamentos e frustrações pela posição, atividades e desempenho na Igreja constitui um mal a ser evitado. Alegre-se com o progresso do teu irmão e aceite a posição que Deus colocou pra você.
3.6. Terceiro Anúncio da Paixão (20,17-19)
Jesus está há três anos com o grupo dos doze. É preciso que eles tomem consciência da paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo, por isso os diversos anúncios da paixão.
3.7. O Pedido dos Filhos de Zebedeu (20,20-23)
O desejo de ocupar os primeiros lugares é próprio do ser humano, mas contraria a virtude da humildade. Dizemos na jaculatória do Sagrado Coração de Jesus: “Jesus manso e humilde de coração, fazei o nosso coração semelhante ao vosso”. Essa oração deve ser uma constante na vida do católico. O pedido absurdo de João e Thiago é uma advertência para todo católico.
3.8. Os Chefes devem Servir (20,24-28)
Logo após ouvir o pedido de primeiro lugar de João e Thiago, Jesus nos ensina que ser grande significa servir. O maior não é aquele que é servido, mas aquele que serve, pois ele próprio, Jesus Cristo, veio a mundo para servir. Será preciso que cada um de nós nos esforcemos para que no dia-a-dia entendamos essa verdade: Servir é maior e melhor que ser servido…
3.9. Os Dois Cegos de Jericó (20,29-34)
A cura dos dois cegos de Jericó está colocada no final de toda sequência de curas, mensagens e prescrições. Volte e leia desde o item 3.1 a 3.8. Quem entendeu e pretende viver esses ensinamentos é como o cego que volta a ver.
3.9. Entrada Triunfal em Jerusalém (21,1-11)
Jesus já era com o passar do tempo, uma figura famosa e conhecida. Na chegada em Jerusalém para a festa da páscoa, Jesus é aclamado pelo povo, festejado nas ruas e celebrado em cada esquina. Mas Jesus sabe que essa chegada em Jerusalém será para enfrentar a paixão e a morte, mas ele ressuscitará. Não nos iludamos com aqueles que nos celebram e nos festejam, pois os mesmos que celebraram Jesus no Domingo de Ramos, gritaram: “Crucifica-o!” na sexta-feira da paixão.
3.10. Vendedores Expulsos do Templo (21,12-17)
A cena de expulsão dos vendedores que usavam o templo para o comércio é uma alusão à seriedade da liturgia, de como devemos amar e zelar pela casa de Deus.
3.11. A Figueira Estéril (21,18-22)
A figueira estéril tem duas lições importantes para todos nós. A primeira é que devemos dar frutos, como resultado de nosso seguimento de Cristo. Seguir a Cristo é seguir um padrão diferente de vida, bem diferente do mundo e isso deve ser visível em nossa vida. Mas também tem a lição da oração constante e de como não devemos desistir de orar todo o tempo.
3.12. Banquete Nupcial (22,1-14)
O banquete nupcial é uma alusão ao reino dos céus. O povo de Israel era o povo convidado, por isso Jesus começa por eles o anúncio do reino. Mas eles não aceitaram o convite, razão pela qual o noivo manda convidar todos os que estiverem na rua. Esses somos nós. Uma convidados, uma vez estando no banquete, será preciso que produzamos frutos. Aquele que não produz frutos, será como o convidado que está sem vestes nupciais…
3.13. Tributo a César (22,15-22)
A questão do “dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”, na forma do tributo tem um ensinamento importante para a nossa vida prática. O tributo a César simboliza a nossa vida civil, privada e comum; já o “dai a Deus” simboliza nossa caminhada na Igreja. Jesus quer ensinar duas coisas: Vivamos neste mundo de acordo com as regras legais do mundo, relativo a trabalho, direitos e obrigações com responsabilidade e honestidade; mas lembremos que não somos deste mundo, nosso tesouro está em Deus.
3.14. Ressurreição dos Mortos (22,23-33)
O questionamento acerca de uma suposta vida conjugal no Reino dos Céus é o momento de Jesus explicar e fazer crer que o modelo de vida nos céus será diferente. Enquanto no mundo preza-se por relações a partir de interesses afetivos, sociais, parentais e outros, nos céus os salvos serão seres eminentemente espirituais. O padrão de relações interpessoais entre os salvos, os anjos e o próprio Deus superarão enormemente o modelo de vida que possuímos hoje.
3.15. O Maior dos Mandamentos (22,34-40)
“Tudo se resume no amor”, dizia São João Paulo II. O pecado nada mais é do que uma falta de amor a Deus e ao próximo, pois se amássemos a Deus acima de todas as coisas, e ao próximo como a nós mesmos, não pecaríamos.
3.16. Cristo, Filho e Senhor de Davi (22,41-46)
Os judeus acreditavam que o Messias, o Salvador, seria da descendência de Davi. Por isso, São Mateus inicia o seu Evangelho mostrando que Jesus, por meio de José, descende do Rei Davi e de Abraão. Mas ao mesmo tempo, Davi no Salmo 110,1 se refere a Cristo como “Senhor”. Ora, isso é contraditório, como pode o meu antepassado chamar-me de Senhor? Tal dilema somente é explicado pela encarnação, pois de fato, Deus e Senhor de tudo se encarnou e se tornou filho de Maria, e, portanto, descendente de Davi.
Gabriel Campos, 08 de março de 2024, memória de Santas Perpétua e Felicidade.